Cláusulas insubordinadas: um breve olhar interlinguístico

  • Clauses insubordonnées : un bref regard interlinguistique
  • Insubordinate clauses: a short interlinguistic overview

O presente artigo tem por objetivo analisar a estrutura formal de cláusulas insubordinadas (EVANS, 2007) encontradas em folhetins do Jornal do Commercio do Rio de Janeiro e de Figaro do século XIX. A noção de insubordinação proposta por Evans (2007) acolhe um olhar que entende o fenômeno em análise como resultado de processo diacrônico de mudança. Nessa perspectiva, entendemos que a proposta funcionalista de análise de cláusulas contempla a insubordinação uma vez que prevê, no contexto da hipotaxe, processos de articulação de cláusulas que levam em conta critérios como a dependência semântica e o encaixamento formal. Partimos do pressuposto de que tanto nas estruturas encontradas em português quanto naquelas em francês é possível traçar certa coincidência nos padrões formais. No caminho de tal verificação, levamos em conta cinco critérios formais, que são: 1. introdutor da cláusula insubordinada; 2. pontuação antecedente à cláusula insubordinada; 3. modo verbal da cláusula insubordinada; 4. forma verbal da cláusula insubordinada; 5. relação da cláusula insubordinada com material linguístico do entorno. Os resultados obtidos em cada um deles, bem como o cruzamento de critérios, permitiram que observássemos congruência entre as escolhas formais para as cláusulas insubordinadas nos folhetins coletados de ambos os jornais. Isso revela que há uma tendência formal, no corpus, para a realização da insubordinação.

Le présent article a comme objectif l’examen de la structure formelle des clauses d'insoumission (EVANS, 2007) trouvées des roman-feuilletons publiés dans le Jornal do Commercio do Rio de Janeiro et du Figaro du XIXe siècle. La notion d’insubordination proposée par Evans (2007) accueille un regard qui comprend le phénomène analysé comme le résultat d’un processus de changement diachronique. Dans cette perspective, nous comprenons que la proposition fonctionnaliste de l’analyse des clauses envisage l’insubordination puisqu’elle prévoit, dans le contexte de l’hypotaxe, des processus d’articulation des clauses qui tiennent compte de critères tels que la dépendance sémantique et l’enchâssement formel. Nous partons de l’hypothèse qu’il est possible de retrouver une certaine coïncidence dans les modèles formels des structures en portugais et en français. Pour vérifier notre hypothèse, nous prenons en compte cinq critères formels, qui sont : 1. l’introducteur de la clause insubordonnée ; 2. la ponctuation précédant la clause insubordonnée ; 3. le mode verbal de la clause insubordonnée ; 4. la forme du verbe de la clause insubordonnée ; 5. la relation de la clause insubordonnée avec le contexte linguistique environnant. Les résultats obtenus dans chacun d’eux, ainsi que le croisement des critères, nous ont permis d’observer une congruence entre les choix formels des clauses d’insubordination dans les roman-feuilletons collectés les deux journaux. Cela révèle qu’il existe une tendance formelle, dans le corpus, à la réalisation de l’insubordination.

This paper aims to examine the formal structure of insubordinate clauses (EVANS, 2007) found in newspaper serials from the Jornal do Commercio do Rio de Janeiro and the Figaro from the nineteenth century. The notion of insubordination proposed by Evans (2007) includes a view that understands the phenomenon as a result of a diachronic process of change. From this perspective, we learn that the functionalist proposal of clause analysis encompasses insubordination since it predicts, in the context of hypotaxis, clause combining processes which take into account criteria such as semantic dependence and embedment. We assume that both the structures found in Portuguese and those found in French make it possible for us to outline some coincidences when it comes to formal patterns. With a view to testing our hypothesis, we have designed five formal criteria, which are: 1. insubordinate clause opener; 2. punctuation preceding the insubordination clause ; 3. verbal form of the insubordinate clause; 4. verb tense of the insubordinate clause; 5. link between the insubordinate clause and the surrounding linguistic material. The results from each, as well as the combination of these criteria, have allowed us to understand the congruence between the formal choices in insubordinate clauses found in both newspapers’ serials. This reveals a formal trend in the corpus towards the production of insubordination.

Plan

Texte

Introdução

O presente trabalho tem por objetivo verificar, de forma quali-quantitativa, a ocorrência de cláusulas insubordinadas (EVANS, 2007; EVANS & WATANABE, 2016; RODRIGUES, 2021) como recursos discursivos em folhetins brasileiros e franceses do século XIX. Também intentamos mapear as tipologias formais das ocorrências insubordinadas e identificar as semelhanças e divergências formais na observação interlinguística. Extraímos nossos dados da seção de folhetins dos periódicos Jornal do Commercio do Rio de Janeiro (JC), do ano de 1839, e Figaro (FG), de 1854. Partimos da hipótese de que a ocorrência de cláusulas insubordinadas tende a obedecer padrões formais similares em línguas diferentes e de que a natureza do gênero em análise contribui para a ocorrência da insubordinação.

Para tratar das cláusulas independentes, entendemos ser pertinente buscar apoio nos quadros teóricos do funcionalismo linguístico. Partimos, também, dos apontamentos de Evans (2007) e de Evans e Watanabe (2016) sobre o problema da infinitude em cláusulas que, aparentemente, atuavam como principais. Os autores propõem a ideia de insubordinação e traçam estruturas formais que, em diferentes línguas, operam como marcas de insubordinação. Também levamos em conta a discussão de Rodrigues (2021) sobre os casos de insubordinação no português brasileiro. Caracterizamos nossos dados de acordo com uma série de critérios responsáveis por mapear aspectos sintáticos e gráficos das cláusulas em análise. Dessa forma, podemos operar a discussão sobre quais aspectos estão ligados mais ou menos a qual língua e quais deles operam de maneira semelhante tanto em português quanto em francês.

Para alcançar os objetivos pretendidos, o artigo está dividido da seguinte forma: em primeiro momento, trataremos da discussão sobre o quadro teórico que melhor recebe os anseios da investigação, buscando explicar os problemas de enquadramento das cláusulas insubordinadas dentro de uma perspectiva tradicional. Em seguida, descreveremos a metodologia empregada na pesquisa. Enfim, analisaremos os dados coletados de acordo com os critérios estabelecidos. Dessa forma, apresentaremos os resultados e as discussões deles decorrentes.

Referenciais teóricos

O problema da insubordinação

A problemática que orbita ao redor das cláusulas insubordinadas está ligada, na discussão proposta por Evans (2007) e Evans & Watanabe (2016), à insurgência de cláusulas aparentemente subordinadas atuando como independentes. A dificuldade de alocar, dentro de algum referencial teórico, esse tipo de ocorrência linguística leva Evans (2007) a propor a noção de insubordinação, descrita por ele como o “uso convencionalizado como cláusula principal do que parecem ser, a princípio, formalmente subordinadas” (EVANS, 2007, p. 367, tradução nossa).

Estamos lidando, portanto, com estruturas linguísticas do tipo encontrado em (1) e em (2) a seguir. Nas cláusulas destacadas, observamos alguns traços de subordinação, tais como o introdutor e a forma do verbo. As cláusulas, no entanto, ocorrem sem conexão ou mesmo sem a presença, no cotexto, de algo que se assemelhe à oração principal. Essa combinação de características e traduz no processo de insubordinação.

(1)- E vós tambem estais enganado, eu vo-lo assegurp. Se conheceis essa gente, se sois seu protector, seu patrono, sêde-o embora: não vo-lo embaraço. / - Se tive a desgraça de vos offender, senhor...
Fonte: JC

(2)- J'ai donné parole a Despréaux pour la prochaine vacance, dit-il ; mais je vous jure que votre protégé passera immédiatement après lui. / Lafontaine se confondit en remerciments. / - Maintenant que la paix est faite, dit le roi, M. de Lafontaine vondra bien achever sa lecture, je pense ? - Qu'il fasse comme si je n'étais pas là.
Fonte: FG

Para explicar a emergência desse tipo de fenômeno, o autor recorre à explicação diacrônica que envolve, na gênese da insubordinação, um processo de subordinação prototípico, isto é, uma relação entre principal e subordinada. A guinada à insubordinação é iniciada a partir do momento em que ocorre a elipse da oração principal. Esse apagamento, em primeiro momento, ainda é possível de ser desfeito, recuperando a estrutura principal ora presente.

Quando a elipse passa a ser convencionalizada, encontramo-nos diante de certa restrição de interpretação do material linguístico, apenas podendo levar em consideração as informações relacionadas à cláusula subordinada, agora independente, sem que se possa reaver o material da principal. Por fim, a cláusula antes subordinada é reanalisada como principal, consagrando o uso insubordinado. No esquema (1) abaixo, Evans & Watanabe (2016) ilustram o caminho diacrônico desde a subordinação prototípica até a ocorrência plena da insubordinação:

Esquema 1: da subordinação à insubordinação

Subordinação

Elipse da principal

Convencionalização da elipse

Reanálise como cláusula principal

A

B

C

D

Construções bi-clausais, contendo uma subordinada.

Elipse da principal, com possível recuperação de algum material do contexto.

Restrição da interpretação do material elipsado.

Uso convencionalizado como cláusula principal da antiga subordinada.

Fonte: adaptado de Evans & Watanabe (2016), tradução nossa.

O esforço teórico empreendido por Evans & Watanabe (2016) tem caráter interlinguístico na medida em que busca reunir ocorrências de diferentes línguas com o objetivo de mapear padrões formais e funcionais envolvidos em processos de insubordinação. Essa relação permite, para além de observar os padrões encontrados em diversas línguas, analisar em que grau ocorrem nos casos de insubordinação em português e em francês.

Rodrigues (2021) propõe uma leitura de insubordinação para cláusulas que apresentam aspecto de subordinadas completivas em português mas que ocorrem de maneira independente. Para a autora, esse tipo de estrutura, introduzida por conjunção integrante e seguida de subjuntivo, expressa algum tipo de volição da qual podemos inferir algum elemento verbal que se concentre nesse nicho semântico. No francês, Debaisieux, Martin & Deulofeu (2019) analisam a ocorrência dos padrões si tu savais e quand je pense, ambos portadores de características subordinativas mas de histórico de dados insubordinados. Para os autores, há uma distinção importante a ser feita: é necessário entender se as estruturas em análise compõem, de fato, a padrões de insubordinação ou se, por outro lado, são apenas representantes de certo padrão discursivo.

O enquadramento teórico

Affonso Jr. (2022) chama atenção para a dificuldade de alocação, no caso do português, de processos de insubordinação no contexto da gramática tradicional (GT). Nos quadros da GT, a subordinação é vista como processo de dependência entre uma oração subordinada e sua principal. Não há, nesse ínterim, espaço para a concepção de cláusulas com características de subordinação que ocorram de maneira independente.

Por essa razão, o quadro da linguística funcional parece abarcar com melhor embasamento o fenômeno em análise. Isso se dá, em primeiro lugar, pela observação pela observação de fatos da língua ser primordial à designação do funcionamento linguístico. Em segundo, e de maneira mais específica, porque a visão funcionalista de Halliday (1985) sobre o processo de articulação de cláusulas levar em consideração dois tipos de critérios para a concepção dos processos: integração forma, que diz respeito ao elo sintático entre as cláusulas, e dependência semântica, avaliando as nuances de sentido estabelecidas entre uma oração e outra.

A partir desse entendimento, Hopper e Traugott (1993) concebe um continuum de articulação de cláusulas que vai desde o maior grau de encaixamento sintático com dependência semântica (subordinação) até o menor nível de encaixamento, também com dependência semântica (parataxe). No esquema (2) a seguir, observamos a ilustração dos diferentes processos envolvidos dentro da articulação de cláusulas, levando em conta a distinção promovida pelos critérios que orientam Hopper e Traugott (1993).

Esquema 2: da parataxe à subordinação

PARATAXE

HIPOTAXE

SUBORDINAÇÃO

Nenhuma integração formal

Menor integração formal

Total integração formal

Coordenadas

Circunstanciais e restritivas apositivas

Completivas e relativas restritivas

Fonte: adaptado a partir de Hopper e Traugott (1993, p. 170).

A concepção de distintos critérios e, sobretudo, de diferentes graus de encaixamento permite vislumbrar algum cenário em que as cláusulas insubordinadas encontrem algum espaço alheio à dicotomia coordenação-subordinação. Sendo possível considerar a integração formal, de um lado, e as relações semânticas veiculadas, conseguimos alocar a insubordinação numa posição em que a integração formal não seja latente mas que alguma característica de dependência formal (e funcional) ainda esteja presente.

Metodologia

Para que alcançássemos os objetivos propostos, as etapas de realização do trabalho desenvolveram-se da seguinte maneira: em primeiro momento, dedicamos nossos esforços à leitura dos folhetins publicados tanto no Jornal do Commercio do Rio de Janeiro quanto no Figaro. Selecionamos duas histórias que se estendiam por mais de uma edição dos periódicos porque entendemos, assim, que haveria certa homogeneidade na condução da escrita. Em JC, selecionamos os dados da história intitulada A filha do negociante. Em FG, extraímos as ocorrências da narrativa Mademoiselle de Fontage.

Escolhidas as histórias de que seriam extraídos os dados, efetuamos a leitura e extração das ocorrências encontradas no texto dos folhetins. Retiramos os dados de JC a partir do acesso aos periódicos através do site da Fundação Biblioteca Nacional (FBN), que disponibiliza todas as edições do jornal em formato PDF. De FG, extraímos os dados a partir de documentos também no formato PDF disponíveis na plataforma Gallica, da Bibliothèque Nationale de France (BNF), que, assim como a FBN, dispõe de todos os arquivos do periódico.

Assim que encontradas, as ocorrências de cláusulas insubordinadas foram transcritas a uma tabela do google sheets, em que seccionamos os dados em língua portuguesa daqueles em francês. É interessante pontuar que conduzimos as referidas transcrições de forma a preservar, da forma mais fiel possível, a grafia com que haviam sido escritas as histórias.

Feitas as transcrições, categorizamos os dados encontrados de acordo com cinco critérios de natureza formal. Tais critérios têm por objetivo mapear as estruturas linguísticas sintáticas e gráficas em jogo na manutenção da característica subordinativa presente na cláusula classificada como insubordinada. Assumimos, portanto, o entendimento da função de um ou mais fatores, quando combinados entre si, de preservar algum traço formal que permita identificar a relação de subordinação que ainda persiste na cláusula em análise. Os critérios mencionados são: 1. introdutor da cláusula insubordinada; 2. pontuação antecedente à cláusula insubordinada; 3. modo verbal da cláusula insubordinada; 4. forma verbal da cláusula insubordinada; 5. relação da cláusula insubordinada com material linguístico do entorno.

A classificação de acordo com cada critério foi realizada através da aplicação dos filtros disponíveis na própria planilha google sheet. Essa ferramenta permite a aplicação de determinada notação referente a cada possibilidade de realização dentro de cada critério. Assim, dispondo os critérios em colunas adjacentes, é possível combinar critérios a fim de analisar as consequências da atuação de mais de um fator sobre a manutenção das características de subordinação. Na imagem (1) a seguir, observamos parte da tabela com os dados de JC na primeira coluna à esquerda e, à direita, cinco colunas numeradas de acordo com o critério em análise. Abaixo delas, verificamos as notações mencionadas. Nas duas últimas colunas, observamos a edição e o periódico do qual extraímos o dado.

Imagem 1: dados de JC tabelados

Imagem 1: dados de JC tabelados

Fonte: elaboração própria.

Resultados e análise

No corpus sob análise, encontramos um total de 40 ocorrências de cláusulas insubordinadas, sendo 22 nos folhetins do Jornal do Commercio e 18 nos folhetins do Figaro. A partir desse resultado, caracterizamos os dados segundo os critérios destrinchados na seção Metodologia, dos quais trataremos daqui por diante. Analisaremos cada um dos critérios separadamente e, ao final, reuniremos alguns cruzamentos de dados capazes de revelar relações entre as marcas formais de subordinação.

Introdutor da cláusula

Quanto ao introdutor da cláusula insubordinada, observamos a ocorrência de sete possibilidades, entre as quais os dados distribuíram-se conforme a tabela 1 a seguir:

Tabela 1: Introdutor da cláusula insubordinada

Introdutor

N.º de ocorrências / %

JC

FG

1. Ausência de introdutor

12 / 54%

5 / 28%

2. Pronome relativo

1 / 4,5%

X

3. Conjunção integrante

1 / 4,5%

6 / 33,5%

4. Preposição

1 / 4,5%

X

5. Conjunção subordinativa

6 / 27%

6 / 33,5%

6. Preposição + conjunção integrante

1 / 4,5%

X

7. Parte de par correlato

X

1 / 5,5%

Fonte: elaboração própria.

Observamos que apenas 3 critérios foram identificados nos dados provenientes tanto de dados em português quanto em francês: ausência de introdutor, conjunção integrante e conjunção subordinativa. Quanto aos dados de JC, 54% (12/22), apresentaram-se sem a presença de um introdutor de cláusula, resultado que contrasta com apenas 27% (5/18) dos dados de FG nessa mesma condição. Em JC, observamos, também, que cerca de 27% (6/22) dos dados foram introduzidos por conjunção subordinativa, enquanto em FG 33 % (6/18) dos dados apresentaram-se nessa condição. Em (3) a seguir, destacamos uma ocorrência de JC sem a presença de um introdutor formal da cláusula.

(3)O advogado Jeffrey era humano; foi em socorro da moça, e a socegou do melhor que pôde. Levárão-na para outro gabinete. Porém o Sr. Jeffrey não pôde aplacar a colera do pai, que tarde reconhecia sua falta de prudencia. Trazer juntas duas pessoas da mesma idade! preparar elle mesmo esta catastrophe!
Fonte: JC.

No dado apresentado, chama atenção a forma nominal do verbo como marca importante de manutenção do caráter subordinativo em questão. A discussão que Evans (2007) promove para se chegar ao fenômeno da insubordinação é concebida no âmbito do problema da alocação das cláusulas infinitivas, que, por aparentemente não exercerem função de principal, necessitam de melhor alocação dentro dos processos de articulação de cláusulas. Opção diferente de manutenção encontramos em (4) a seguir.

(4)- Par malheur, dis-tu ? Ils ont raison, ventrebleu ! sécria le comte ; - tu devrais rougir seulement de te le faire rappeler par d'autres. Oh ! si tu avais vécu de mon temps!... Un rude temps, chevalier, où l'on ne baillair guère à la lune, et où les gentilshommes disaient plus de jurons que de fadaises !
Fonte: FG.

A estrutura em jogo no dado apresentado difere da que dissecamos em (3) pela presença do elemento introdutor subordinativo si, uma conjunção com valor condicional. No exemplo, estamos diante de uma estrutura verbal finita que reforça o papel do conector como chave para capitanear as informações subordinativas que restam à cláusula e que a ela conseguimos atribuir.

Essas duas marcas introdutórias – tanto a ausência de introdutor quanto a opção por conjunção subordinativa – possibilitam explorar uma das formas remanescentes de subordinação que nos possibilita caracterizar os dados como insubordinados: no caso da ausência de introdutor, a marca de subordinação provavelmente será expressa a partir da escolha de outras possibilidades formais, como uma forma verbal específica. A estratégia em FG, por exemplo, aponta que tanto a ausência de conector quanto a opção pela conjunção integrante e a escolha de uma conjunção subordinativa configuraram, dentro das histórias em análise, as marcas preferidas de se manter a característica subordinativa.

Pontuação antecedente

Quanto à pontuação que antecede as cláusulas insubordinadas encontradas, observamos a ocorrência de oito padrões: ausência de pontuação antecedente, ponto final, reticências, ponto de interrogação, ponto de exclamação , combinação de pontuações (como ponto de exclamação seguido de reticências, por exemplo), vírgula e ponto e vírgula. Na tabela a seguir, destrinchamos a frequência dos dados por periódico.

Tabela 2: pontuação antecedente à cláusula insubordinada

Sinal de pontuação

N.º de ocorrências / %

JC

FG

1. Ausência de pontuação

1 / 4,5%

1 / 5,5%

2. Ponto final

2 / 9%

3 / 16,5%

3. Reticências

5 / 23%

1 / 5,5%

4. Ponto de interrogação

1 / 4,5%

2 / 11%

5. Ponto de exclamação

3 / 13,5%

1 / 5,5%

6. Combinação de pontuação

5 / 23%

3 / 16,5%

7. Vírgula

3 / 13,5%

4 / 22%

8. Ponto e vírgula

2 / 9%

3 / 16,5%

Fonte: elaboração própria.

Cabe destacar, em primeiro momento, que o critério (6) Combinação de pontuação consiste na caracterização dos dados em que encontramos uso de mais de um sinal de pontuação co-ocorrentes. Estamos tratando, por exemplo, da combinação de reticências a um ponto interrogação ou a uma exclamação. Tal combinação ajuda a reforçar, quando presente, a separação gráfica a que estão submetidas as cláusulas – argumento importante na defesa da existência de saliente separação entre uma cláusula que poderia, não havendo marca consistente de separação, ser considerada principal e uma outra que seria apenas uma subordinada.

Em JC, as reticências figuram como mais presentes em se tratando de separação gráfica de cláusulas. Entendemos essa escolha como uma tentativa de materializar com mais fidelidade os diálogos retratados no folhetim. Ilustramos essa conclusão no destaque em (5) a seguir:

(5)Maria dez sinal affirmativo, e deitou a chorar. / - Minha pobre tia me amava... sim ella... mas meu pai!... / - Vosso pai vai bem, o primeiro momento de dôr passou depressa... / E se elle soubesse que me acho aqui?... / - Ah! senhora, podeis fazer-me semelhante pergunta?1
Fonte: JC.

Levando em consideração a forma de diálogo retratada em (5), compreendemos que as reticências atuam como interruptor de fluxo de fala e, por consequência, isolam graficamente a cláusula insubordinada. Ocorrência diferente encontramos em (6) a seguir.

(6)- Marie, dit-il en lui prenant la main dans les siennes, à votre tour, pardonnez-moi ma violence... J'ai tant souffert, si vous saviez !... Une horrible fatalité pèse sur nous, et Dieu n'a pas voulu nous réunir, comme nous pouvions l'ésperer. - Voici votre marguerite, rendez-moi la mienne, - si vous l'avez encore…
Fonte: FG.

No exemplo de FG, a vírgula empregada antes da oração em destaque não oferece divisão saliente entre as cláusulas em jogo. Não há, no entanto, relação de condição/consequência entre ambas, noção esperada a partir do emprego da conjunção si, o que favorece o entendimento de que estamos diante de uma cláusula insubordinada.

Modo verbal

Na caracterização desse critério, incluímos não apenas os modos indicativo e subjuntivo, conhecidos pelo rótulo de modo na gramática tradicional, mas também as formas nominais gerúndio e infinitivo, por entendermos que essas formas estariam ou não associadas à características subordinativas: no caso do indicativo, a não-associação direta à forma subordinativa explica, justamente, a necessidade da adoção de outras estratégias, como a presença de conector que mantenha tais características.

Tabela 3: modo verbal das cláusulas insubordinadas

Modo verbal

N.º de ocorrências / %

JC

FG

1. Indicativo

4 / 18%

7 / 39%

2. Subjuntivo

7 / 32%

6 / 33,5%

3. Gerúndio

X

2 / 11%

4. Infinitivo

11 / 50%

3 / 16,5%

Fonte: elaboração própria.

A presença do infinitivo em 11 dados encontrados em JC aponta para o mesmo problema ora discutido por Evans (2007) e por nós pontuado: a questão da alocação, dentro dos processos de articulação de cláusulas, das orações infinitivas que ocorrem de forma independente. A manutenção das características de subordinação refletida pela escolha dessa forma nominal está exemplificada em (7) a seguir.

(7)- E vós tambem estais enganado, eu vo-lo assegurp. Se conheceis essa gente, se sois seu protector, seu patrono, sêde-o embora: não vo-lo embaraço. / - Se tive a desgraça de vos offender, senhor... / - Offender! essa não he má; vindes insultar-me em minha casa, e fallais de offender-me? / Fallais de hum insulto imaginario; e eu por minha vez peço-vos a explicação de vossas extravagantes expressões.
Fonte: JC.

Mesmo apresentando dados infinitivos, as ocorrências em FG demonstram que, nos folhetins franceses em análise, houve certa preferência pelo indicativo e pelo subjuntivo, escolhas que aparentemente caminham em direção oposta já que, de um lado, o subjuntivo atua na preservação de características subordinativas e o indicativo, menos.

Pretendemos discutir a relação do indicativo francês com as características de subordinação mais à frente. Por essa razão, apresentamos, em (8), dado com ocorrência do modo subjuntivo.

(8)Voilà un hasard fort heureux, dit-il quand Raoul eut achevé son récit. Tu nous devais, certes, ce quartier de cerf, chevalier! Je ne t'en remercie pas moins d'avoir pensé à nous. Holà ! Germain ! apportez ici un pot de vin de Saône et que nous trinquions à la santé du roi !
Fonte: FG.

A cláusula destacada em (8) assemelha-se aos dados discutidos nas primeiras dissecações de Rodrigues (2021) sobre situações de insubordinação no português brasileiro. A autora aponta que orações introduzidas pela conjunção integrante que seguida de subjuntivo contemplam, geralmente, caráter volitivo. É como se pudéssemos depreender um verbo como desejo ou espero antes da realização da oração.

Forma verbal

A análise da forma verbal das cláusulas insubordinadas, atua como indicador da necessidade de outras marcas de subordinação, em se tratando de cláusulas desenvolvidas, ou da presença de marca de subordinação, quando da ocorrência de cláusulas reduzidas. Por essa razão, entendemos ser interessante à análise avaliar a relação dos resultados das formas verbais encontradas em consonância com outras características – a saber, principalmente o modo verbal envolvido, relação que pretendemos discutir à frente.

Tabela 4: forma das cláusulas insubordinadas

Forma verbal

N.º de ocorrências / %

JC

FG

1. Desenvolvida

11 / 50%

13 / 72%

2. Reduzida

11 / 50%

5 / 28%

Fonte: elaboração própria.

De acordo com os dados da tabela (4), entendemos, no caso das ocorrências em JC, serem escolhidas tanto a forma reduzida como marca de subordinação quanto outras formas, que se valem da forma desenvolvida. Já em FG, há certa preferência por dados desenvolvidos, o que não deixa de ter relação com os resultados dos modos verbais indicativo e subjuntivo. Em (9) abaixo, à forma verbal desenvolvida soubesseis, desenvolvida, são acrescidos o introdutor Se, o modo subjuntivo e o próprio isolamento gráfico da cláusula. Tais elementos combinam-se de forma a consolidar características subordinativas suficientes para a concepção da cláusula como insubordinada.

(9)O corpo da moça tremia, e o seu embaraço augmentava a olhos vistos. Ella procurava esconder-me sua perturbação, e balbuciava mesmo novas questões destituídas de senso comum... Bem depressa a voz se lhe enfraqueceu. / Se soubesseis, me disse ella, quantos cuidados me cansa a sua situação!... Quanta afflicções!... Ah! Sr., qualidades tão raras!... Huma pessoa tão distincta!... E se eu vos dissesse, como a amo...
Fonte: JC.

Organização semelhante está presente em (10) a seguir:

(10)Ses yeux secs remplirent de larmes, et étendant lentement la main sur le front de l'enfant : / - Je te bénis ! dit-elle. Que Dieu te donne tout le bonheur qu'il m'enlève ! j'ai expié ta naissance par d'assez cruelles douleurs !... / Le roulement lointain d'une voiture se fit entendre.
Fonte: FG.

No dado em destaque, o modo verbal subjuntivo, a conjunção integrante Que e a separação gráfica existente configuram a existência de insubordinação a partir da manutenção de certas características. Como vimos em (9), a forma desenvolvida está associada a aspectos capazes de tecer tal elo.

Relação com material no entorno

Interessa-nos analisar a relação da cláusula insubordinada com o material linguístico em seu entorno para entendermos se há, no contexto de produção do dado, alguma recuperação possível do que ora fora sua oração principal. Assumimos, portanto, a existência de alguma relação quando conseguimos, por exemplo, realizar algum tipo de identificação de nuances semânticas relativas ou quando identificamos ligação formal separada graficamente. Na tabela (5) a seguir avaliamos os dados.

Tabela 5: relação da insubordinada com o material no entorno

Relação com material no entorno

N.º de ocorrências / %

JC

FG

1. Há relação

5 / 23%

9 / 50%

2. Não há relação

17 / 77%

9 / 50%

Fonte: elaboração própria.

Os dados de JC revelam certa preferência por insubordinadas desligadas de algum contexto linguístico, não conectadas semântica ou formalmente a cláusulas ao redor. Em (11) a seguir, estamos diante de uma cláusula introduzida pelo conectivo se, no modo subjuntivo. A oração não guarda, analisamos, relações com o material em seu entorno.

(11)O corpo da moça tremia, e o seu embaraço augmentava a olhos vistos. Ella procurava esconder-me sua perturbação, e balbuciava mesmo novas questões destituídas de senso comum... Bem depressa a voz se lhe enfraqueceu. / Se soubesseis, me disse ella, quantos cuidados me cansa a sua situação!... Quanta afflicções!... Ah! Sr., qualidades tão raras!... Huma pessoa tão distincta!... E se eu vos dissesse, como a amo... / Socegai, Sra., entrai em vós, e continuai a ministrar-me explicações que possão ajudar-me a servir, de maneira efficar, a pessoa por quem vos interessais. Eia! hum pouco de coragem.
Fonte: JC.

Já a cláusula infinitiva destacada em (12) a seguir não deixa de se relacionar com a oração [c'était un supplice de toutes les hures !], ao final do trecho, assim como a oração [mais penser qu'un autre avait possédé ce trésor et défloré ses grâces virginales], que, diferentemente da que primeiro destacamos, ocorre de forma subordinada. Entendemos que ambas as orações iniciadas por [mais] aparentam estar coordenadas entre si, tomando para elas a mesma função de especificação ou detalhamento do que é definido na última oração. A diferença, como notamos, é a separação a que a primeira está submetida.

(12)Le malheureux, replié sur lui-même, souffrait affreusement d'un mal sans remède ; malgré tout, malgré son abaissement, malgré sa faute, il amait Marie, et il se l'avouait avec terreur. Il l'eût sue morte, qu'il se serait consolé peut-être ; mais la sentir près de lui, vivante, plus belle et plus désirable que jamais ; mais penser qu'un autre avait possédé ce trésor et défloré ses grâces virginales, c'était un supplice de toutes les hures !
Fonte: FG.

Para além da apuração de cada um dos critérios de análise formal utilizados na caracterização dos dados, propomos uma avaliação das características subordinativas que leve em conta a relação que pode emergir da combinação desses fatores. Essa conjugação revela em que medida os aspectos formais se imbricam ou não para resultar, ao final, um conjunto de características que reflita os resquícios de insubordinação ali presentes. Por isso, analisaremos três cruzamentos de critérios, observados de duas maneiras: 1. ausência de conector em associação à forma reduzida; 2. conjunção subordinativa associada ao subjuntivo e ao indicativo.

Ausência de conector e forma reduzida

Como observamos quando da análise dos introdutores envolvidos na elaboração de cláusulas insubordinadas, outras características de subordinação assumem o papel de perpetuação de tais aspectos. No caso da ausência de conector, identificamos que essa responsabilidade formal recai sobre a forma reduzida da cláusula.

Tabela 6: ausência de conector em associação à forma reduzida

JC

FG

10 / 45,5%

5 / 28%

Fonte: elaboração própria.

Entre os 11 dados com ausência de conector detectada em JC, 10 deles corresponderam à forma reduzida, o que demonstra a forte ligação entre a ausência de uma característica sendo, de certa forma, compensada por outra. Em FG, todos os dados carentes de introdutor estavam arrolados sob a forma reduzida. Em (13) e (14) a seguir, ilustramos, nos dois periódicos, ocorrências em que a forma reduzida se encarregou das características subordinativas.

(13)O advogado Jeffrey era humano; foi em socorro da moça, e a socegou do melhor que pôde. Levárão-na para outro gabinete. Porém o Sr. Jeffrey não pôde aplacar a colera do pai, que tarde reconhecia sua falta de prudencia. Trazer juntas duas pessoas da mesma idade! preparar elle mesmo esta catastrophe! / Como seria descoberto o segredo da correspondencia entre Maria e Elliot? Todas as conjecturas dos jovens forão inuteis: o que de mais provavel havia, era que a aia, que tinha protegido os amores de Elliot, acharia conveniente pôr-se a salvo, trahindo aquelles a quem servira.
Fonte: JC.

(14)- Dieu vivant ! exclama le vieux ligueur ; que me dis-tu là : tu crains fort?... Qu'est-ce que c-est que cette poulle mouillée ? à ton âge, nes pas aimer la guerre?... / - J'aime mieux la chasse, mon oncle. / - Mais, malheureux ! tu es cadet, entends-tu ? y songes-tu bien ? Cadet ! il te faut prendre le froc ou lépée, il n'y a pas milieu. - Vourdais-tu te faire moine, par hasard ?
Fonte: FG.

Conjunção subordinativa: do subjuntivo ao indicativo

Na contra-mão dos exemplos discutidos na associação anterior entre ausência de introdutor e forma reduzida, a ligação presente entre a presença de conjunções subordinativas e as formas subjuntivas e indicativas indicam, guardadas as particularidades do português e do francês, a aliança de fatores sobre os quais recai a manutenção formal da característica subordinativa. É necessário, porém, que cada combinação seja analisada de maneira a focalizar as demandas de cada língua.

Partindo do princípio de que o acúmulo de fatores mencionado anteriormente corresponderia, em se tratando da presença de conjunção subordinativa, ao subsequente uso do subjuntivo, a tabela (7) a seguir corrobora essa análise no que diz respeito ao português. Entre os 6 dados de insubordinadas introduzidas por conjunções subordinativas, 5 estão associados ao uso do subjuntivo.

Tabela 7: conjunção subordinativa associada ao subjuntivo

JC

FG

5 / 23%

1 / 5,5%

Fonte: elaboração própria.

No exemplo destacado em (15) abaixo, a relação discutida anteriormente está disposta.

(15)- Caro Elliot, tende hum pouco de coragem, hum pouco de moderação! Segui o exemplo que vos dá vossa esposa. / Eu o devêra, sem dúvida; porém, sou tão miserável! Se soubesseis que demonio me atormenta e dilacera o coração! Fui eu que a perdi! eu que causei sua desgraça! Sua ruina, sua miseria, a mim só deve! Huma maldição pesa sobre nós! Hallory nos amaldiçôou.
Fonte: JC.

No português, assim entendemos, há relação estreita entre um e outro, recíproca que não encontra espaço nos dados do francês. Das 6 ocorrências de cláusulas insubordinadas introduzidas por conjunção subordinativa em FG, no entanto, apenas uma apresentou-se ligada ao subjuntivo. Essa constatação poderia levar a crer que, entre português e francês, duas formas de combinação de características subordinativas estão em jogo e em sentidos diferentes.

Tal hipótese poderia ser confirmada a partir da análise da tabela (8) a seguir.

Tabela 8: conjunção subordinativa associada ao indicativo

JC

FG

1 / 4,5%

5/ 28%

Fonte: elaboração própria.

A associação das ocorrências das cláusulas insubordinadas introduzidas por conjunção subordinativa nos dados em francês é quase inversa à verificada no português com relação ao subjuntivo: 5 dos 6 dados de conjunção subordinativa do francês estão no indicativo, enquanto no português apenas 1 está. Esse resultado refletiria, como mencionamos, sentidos diferentes para os padrões formais em português, de um lado, e em francês, de outro: ao passo que os dados de folhetins em português sugeririam um caminho de seleção de duas características subordinativas (conjunção subordinativa e subjuntivo), as ocorrências em francês apontariam ao sentido inverso, o da seleção de uma característica subordinativa (conjunção subordinativa) com desprezo ao subjuntivo, que seria, em tese a marca de subordinação prototípica.

O que podemos concluir, na verdade, é que tanto os dados em português quanto os em francês estão apontando para o mesmo caminho: o da seleção de características subordinativas tanto na marcação da conjunção quanto na do modo verbal. Essa conclusão decorre do fato de, nos dados em francês, as conjunções subordinativas introdutoras serem majoritariamente si, que, diferentemente do que ocorre nas orações de tipo semelhante em português, selecionam, via de regra, modo indicativo para a oração que introduzem. Isso quer dizer que, ao combinarem tal conjunção com o modo indicativo do verbo, as ocorrências em francês estão apontando para o mesmo sentido do que se viu em português: marcação de subordinação nos dois elementos. O trecho destacado em (16) exemplifica a explanação: a conjunção si toma a forma savais, no indicativo.

(16)– Éloigne-toi de moi, oublie-moi; laisse-moi vivre seule dans ma honte... porte à une meilleure, à une plus digne, cet amour auquel je n'ai plus droit et sur lequel j'ai indignement marché...Va, je suis déjà bien punie!... Si tu savais, Raoul!... dis-moi seulement que tu me plains et que tu me pardonnes!...
Fonte: FG.

Essas observações, coadunadas à dissecação dos critérios promovida anteriormente, permitem concluir que as cláusulas insubordinadas atuam como recursos discursivos tanto em folhetins brasileiros quanto franceses. O caráter narrativo com predominância de diálogos favoreceu, entendemos, a presença das insubordinadas. Também a estrutura formal em jogo nos pareceu semelhante nas duas línguas, evidenciando uma linha de padrões formais que não se distanciam de maneira significativa.

Considerações finais

Partindo do objetivo de verificar o papel de cláusulas insubordinadas em folhetins brasileiros e franceses do século XIX, mapeamos os padrões formais em jogo para a construção das cláusulas independentes. Consideramos as propostas de Evans (2007) e Evans & Watanabe (2016), levando em conta a evolução diacrônica da insubordinação, para entender o papel desse tipo de estrutura no contexto linguístico. Também entendemos ser adequado tomar o ambiente da linguística funcional como embasamento das discussões.

Para formar nosso corpus, extraímos dados de folhetins do Jornal do Commercio do Rio de Janeiro e do jornal francês Figaro. No primeiro, encontramos 22 dados e, no segundo, 18. Para caracterizá-los, levamos em conta cinco critérios de natureza formal, compreendendo aspectos sintáticos de dependência/independência entre cláusulas e critérios relacionados à representação gráfica, analisando proximidade/distância entre as cláusulas.

A análise dos critérios revelou uma série de características responsáveis por manter formar subordinativas em cláusulas independentes que, por conta disso, ganham status de insubordinadas. Em alguns casos, a predominância de aspectos não-subordinativos, como ocorre ao indicativo, em português, revelou-se participante de um conjunto de aspectos que se ocupa de fazer a manutenção do caráter subordinativo. Dessa forma, entendemos haver, nos dados dos folhetins analisados, similaridade de padrões formais de insubordinação entre as duas línguas, o que demonstra certa tendência dos processos de insubordinação ao optar por marcas de subordinação em cláusulas independentes.

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Notes

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Illustrations

Citer cet article

Référence électronique

Marcelo Rodrigues Affonso Junior, « Cláusulas insubordinadas: um breve olhar interlinguístico », Reflexos [En ligne], 6 | 2023, mis en ligne le 19 avril 2023, consulté le 29 avril 2024. URL : http://interfas.univ-tlse2.fr/reflexos/1314

Auteur

Marcelo Rodrigues Affonso Junior

Universidade Federal do Rio de Janeiro

marcelo.rodrigues@letras.ufrj.br

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